Tragicômico


O riso dos anjos é apenas o reflexo do riso satânico. O Diabo se apoderou da fórmula divina para construir seu reino. Deus não quis conhecer a obra do demo e este se revoltou contra o projeto do primeiro criador. Então o riso funciona como um protesto contra a criação divina e todas as suas leis, sejam elas plausíveis ou não.

O riso é contagiante e o anjo percebe que só poderá conter a ação do oponente imitando-o. São dois tons histéricos que se alternam, um buscando ser mais intenso que o outro. Misturam-se. Não há como distinguir quem emite o som mais agudo. A competição é infindável.

As ditaduras são análogas. Quando se tem o autoritarismo vigente de direita, os escritos ou vozes que aludam ao comunismo são calados violentamente. Os regimes de esquerda são semelhantes. Eliminam sem remorso todas as manifestações contrárias ao seu poderio. Somos fantoches ignorantes e altamente influenciáveis. O riso dominante tenta suprimir aquele que o desafia.

O diabo contesta a política inerente à primeira criação, mas seu reino também não é a mais aprazível das moradas. Os anjos creditam a Deus a manutenção da paz e quem não concorda com seus desígnios deve ser banido.

- Dou-te minha alma, meu reino e meus servidores em troca de aceitação, - diz o Chifrudo, buscando, em um primeiro momento, a unicidade. O lado que representa o bem no drama maniqueísta o descarta. – Desafiaste-me e agora sofrerás as conseqüências. Não te quero ao meu lado, mas abaixo de meu ilustre nome. O que me fizeste não é digno de perdão. Tentas subverter o que é belo e harmônico, no entanto, não conseguirás. Estás fadado ao infortúnio. Rias. Ficas bem atuando com comicidade, antagônico ser. O destino da humanidade é polarizar todas as situações. E é assim que deve ser.

O excluído apenas riu descontroladamente e retornou aos seus domínios. Riria eternamente dos dualismos e conflitos existenciais dos homens. Acreditava que a verdade monolítica ou a pluralidade não combinavam com a personalidade humana. Tentara o acordo apenas para impor sua vontade. Mesmo que conseguisse se apoderar do reino dos céus, jamais revelaria o segredo. O mundo uno seria estupidamente insosso.


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